Fonte: Redação Um Só Planeta
O rio “Laje” é um curso d’água amazônico chamado pelos indígenas da região de “Komi-Memen” e sofre com a contaminação causada pelo plantio de soja e projetos hidrelétricos
Por Redação Um Só Planeta
22/06/2023 17h14 Atualizado há 3 semanas
Moradores da região do rio Laje celebraram a decisão Divulgação
Assim como a natureza tem seu direito de existir, prosperar e se regenerar, pela primeira vez no Brasil um rio terá seus direitos garantidos por lei. O escolhido foi o “Laje”, um curso d’água amazônico na cidade de Guajará-Mirim (RO) chamado pelos indígenas de “Komi-Memen” e que desemboca no Rio Madeira – que também alimenta o Amazonas.
A proposta do vereador Francisco Oro Waram (PSB), liderança da aldeia Waram que fica na região, foi aprovada pela Câmara Municipal e moradores celebraram. A nova legislação considera que o meio ambiente tem direitos inerentes à sua existência, que devem ser reconhecidos para garantir sua preservação. “O Laje é nossa vida, nossa mãe, fornece nossos peixes, nossa sobrevivência”, destacou o vereador.
O texto da lei quis perpassar em linguajar jurídico o conhecimento dos povos originários e diz o seguinte: “Ficam reconhecidos os direitos intrínsecos do Rio Laje-Komi-Memen-como ente vivo e sujeito de direitos, e de todos os outros corpos d´água e seres vivos que nele existam naturalmente ou com quem ele se inter-relaciona, incluindo os seres humanos, na medida em que são inter-relacionados num sistema interconectado, integrado e interdependente”.
Segundo a decisão, o rio tem o direito de “manter seu fluxo natural”, “nutrir e “ser nutrido”, “existir com suas condições físico-químicas adequadas ao seu equilíbrio ecológico” e se relacionar com seres humanos desde que “de suas práticas espirituais, de lazer, da pesca artesanal, agroecológica e cultural”.
Atualmente, a maior preocupação na região são projetos de hidrelétricas no curso das águas e o avanço do plantio de soja, que pode levar à contaminação. Com a lei, a ideia é criar um comitê de “guardiões do rio”, composto por integrantes da comunidade indígena, pescadores, da organização Oro Wari, das mulheres artesãs indígenas e da Universidade Federal de Rondônia. Este órgão seria o “representante dos seus direitos” e por isso deveria ser consultado frente a qualquer avanço de empreendimentos que possam impactar em suas águas.
“Hoje a comunidade indígena é ameaçada por invasores que desmatam as florestas, por pescadores ilegais e por grileiros. O plantio de soja está na porta da nossa aldeia e também as usinas hidrelétricas ameaçam o rio. Vamos usar a nova lei para ter voz, agora as empresas terão que nos consultar primeiramente antes de tentar algum empreendimento”, disse Waram.
O vereador também contou com apoio de Vanessa Hasson e Fabiana Leme, advogadas e fundadoras da ONG Mapa-Caminhos para a Paz. “Quando você reconhece os direitos da natureza, você contribui para a ampliação de consciência de que há interdependência entre os seres da natureza, inclusive os seres humanos”, afirmou Hasson.
“Os direitos da natureza são uma tradução jurídica das cosmovisões dos povos indígenas, tradicionais e originários. É empoderar essas comunidades de que é possível ter mais um instrumento legal ao lado deles”, acrescentou Leme.
Além do Brasil, o rio Ghandi, na Índia, já teve direitos reconhecidos e o rio Whanganui, na Nova Zelândia. Há também cidades nos Estados Unidos com iniciativas semelhantes. Os vanguardistas nesse quesito são Equador e Bolívia, que desde 2008 e 2010, respectivamente, criaram leis em nível nacional para conceder direitos ao meio ambiente.